O novo modelo de tributação do calçado e seu real benefício aos fabricantes de calçados ou de artefatos de couro
Por ACI: 27/01/2020
Publicado no Diário Oficial do Estado do dia 27 de dezembro de 2019, por meio de 2ª Edição, o Decreto nº 54.965/2019, acrescentou ao Regulamento do ICMS, o inciso CLXXXII, ao art. 32, do Livro I, permitindo aos contribuintes fabricantes de calçados e artefatos de couro, com atividade principal enquadrada nos códigos 1521-1/00, 1529-7/00, 1531-9/01, 1531-9/02, 1532-7/00, 1533-5/00 ou 1539-4/00, da Classificação Nacional de Atividades Econômicas – CNAE, a opção ao aproveitamento de crédito presumido do ICMS.
O benefício em comento, aplica-se exclusivamente aos estabelecimentos fabricantes tributados pelo Lucro Real ou Presumido, estando afastados da aplicabilidade os contribuintes enquadrados no Simples Nacional e os estabelecimentos atacadistas e varejistas.
A sistemática do crédito presumido de ICMS, tem por objetivo, reduzir o ônus tributário do ICMS incidente sobre as operações de venda. Importa ressaltar, que a alíquota do ICMS incidente sobre as operações não sofre modificação, permanecendo em 18%.
O ônus tributário as operações com calçados e artefatos de couro, era de 12%. Referido percentual, resulta do diferimento parcial que incide sobre tais operações, conforme disposições contidas nos arts. 1º-A e seguintes, do Livro III, do Regulamento do ICMS – Decreto nº 37.699/97 (RICMS/97). Nesta situação, a legislação assegura o crédito dos insumos utilizados na fabricação.
Já o novo ônus tributário de 4%, é fruto da aplicação do crédito presumido do ICMS, optativo para os contribuintes fabricantes de calçados e artefatos de couro. Este ônus é resultado do débito de ICMS, calculado à 18%, destacado no documento de venda, confrontado com um crédito de 14% realizado nos livros fiscais, resultando no recolhimento efetivo de 4% sobre a operação.
Sendo assim, ao optar pela nova modalidade de crédito presumido, os fabricantes de calçados e de artefatos de couro serão beneficiados com uma redução na carga tributária incidente sobre suas vendas de 14%, desde que, atendam à algumas condições impostas para a utilização do referido crédito, conforme se passa a expor.
CONDICIONANTES DA OPÇÃO PELO CRÉDITO PRESUMIDO DE ICMS
Ao optar pela sistemática do crédito presumido, o contribuinte estará obrigado a realizar o estorno, ou não se creditar, do ICMS incidente sobre a entrada de bens, mercadorias e serviços e de quaisquer insumos incorridos na produção e comercialização dos calçados. O resultado deste não aproveitamento, será compensado com o desembolso de 4% sobre o valor da venda. Anteriormente, a venda era onerado em 7%, 12% ou 18%.
Além da obrigação de estornar/não creditar o ICMS sobre a aquisição de insumos, o contribuinte que optar pelo crédito presumido em comento, é obrigado a antecipar o ICMS diferido nas operações de compra, ou seja, sobre as aquisições em que o ICMS foi integralmente ou parcialmente diferido.
Para tanto, o fabricante deverá realizar um débito de responsabilidade em seus livros fiscais, pagando ao Estado a diferença diferida, que pode representar 6% ou 18% sobre a operação de compra.
Ainda, a opção ao crédito presumido, condiciona o contribuinte a:
a) utilizar, no mínimo, 85% de matéria prima produzida em território nacional e que a parcela importada, se houver, seja importada por meio de portos ou aeroportos situados no Estado, observando-se ainda:
1 – será admitida a importação por meio de outras unidades da Federação até o limite de 2% (dois por cento) do valor aduaneiro total das importações realizadas pelo estabelecimento a cada ano civil;
2 - a condição de que se utilize matéria-prima importada por meio de portos ou aeroportos situados no Estado poderá ser dispensada pelo Subsecretário da Receita Estadual, mediante comprovação da impossibilidade de seu cumprimento;
3 - caso a matéria-prima não tenha sido importada diretamente pelo beneficiário, este deverá manter à disposição do fisco, pelo prazo decadencial, a declaração do importador inscrito no CGC/TE, atestando que a matéria-prima foi importada por meio de portos ou aeroportos situados no Estado;
b) que o estabelecimento beneficiário adquira matériaprima produzida no Estado, em valor correspondente a, pelo menos, 50% (cinquenta por cento) do total de matériaprima utilizada na industrialização;
c) que, pelo menos, 90% (noventa por cento) do processo de industrialização, incluindo as industrializações por
encomenda, ocorra em território gaúcho.
b) permanecer nessa sistemática por período não inferior a 12 meses;
c) até o último dia do mês que fizer a opção:
1 - estornar o valor do crédito de imposto correspondente ao estoque das mercadorias, somente podendo creditar-se do valor correspondente ao estoque das mercadorias quando não estiver mais submetido à sistemática;
2 - escriturar o débito de responsabilidade pelo valor adicionado relativo às mercadorias em estoque que tenham sido objeto de operações de industrialização por terceiros referidas no item II do Apêndice II;
3 - mensalmente, escriturar o débito de responsabilidade pelo valor adicionado relativo às mercadorias que tenham sido objeto de operações de industrialização por terceiros referidas no item II do Apêndice II no mês.
As condições impostas são cumulativas, ou seja, devem ser atendidas em sua integralidade para opção e permanência na sistemática do crédito presumido do ICMS, que conforme simulações que seguem, podem ou não ser vantajosos para aqueles contribuintes que optarem por sua utilização.
SIMULAÇÃO DE CÁLCULO LEVANDO EM CONSIDERAÇÃO A REALIDADE DE UMA INDÚSTRIA CALÇADISTA
Buscando verificar se a aplicação do crédito presumido será vantajosa aos contribuintes que optarem por sua utilização, utilizou-se como base a realidade tributaria de um fabricante calçadista.
Primeiramente, cabe ressaltar que existem duas variáveis intervenientes no cálculo, quais sejam:
a) percentual de participação/incidência do valor dos insumos
passíveis de crédito em relação ao valor venal1;
b) alíquota do ICMS incidente sobre a venda;
De forma indireta, interferem no cálculo o valor do ICMS apurado sobre os estoques e o IRPJ e a CSLL.
Apresentadas as variáveis diretas e indiretas do cálculo, cabe observar que a presente simulação não considerou as variáveis indiretas por tratarem-se de informações particulares ao modelo tributária de cada empresa no tocante ao IRPJ e a CSLL, e a estrutura organizacional no tocante à gestão de estoques.
DO CÁLCULO
Simulação “A”
Parte-se do pressuposto que, a fabricante realize suas vendas em território gaúcho, região sul e sudeste mantendo alíquota média sobre suas vendas em 12%, e que, seu custo com insumos represente até 44,45%2 do seu preço de venda. Neste caso, a opção pelo crédito presumido do Decreto nº 54.965/19 pode ser positiva, restando imutável a situação tributária da empresa se alcançado o limite percentual indicado.
Simulação “B”
Para o fabricante que realize suas vendas nacionalmente de forma que a alíquota média do ICMS represente 9,5% sobre suas vendas, e que, seu custo com insumos represente até 30,55%3 do seu preço de venda, a opção pelo crédito presumido do Decreto nº 54.965/19 pode ser positiva, restando imutável a situação tributária da empresa se alcançado o limite percentual indicado.
Conforme as simulações acima, se o custo de insumos da empresa for inferior aos percentuais indicados, esta registrará ganho, sobre o qual, deverá incidir IRPJ e CSLL, variáveis indiretas anteriormente referendadas.
No tocante a variável indireta estoque, esta terá influência no cálculo se no ato da adesão ao crédito presumido houver estoque positivo, ou seja, havendo estoque de mercadorias no momento da adesão, o fabricante deverá realizar o estorno do ICMS incidente sobre o valor deste estoque4, gerando valor a pagar que poderá ser compensado, financeiramente, com o possível ganho apurado.
Sendo assim, existindo estoque positivo, e considerando no fluxo financeiro o montante de ICMS devido sobre o mesmo, o fabricante deverá considerar este fluxo para apurar o momento/período no qual efetivamente registrará como positivo seu ganho.
Para adesão ao decreto é indispensável que o fabricante faça uma avaliação do seu volume de vendas a cada estado da Federação (participação de cada estado em seu faturamento), principalmente se realizar venda direta por meio de e-commerce, tendo em vista que sua alíquota média de ICMS sobre vendas sofre redução quando ocorrem vendas aos estados do norte e nordeste.
Ressaltamos que, a simulação apresentada foi realizada com base em números de uma empresa que apresenta resultado positivo, bem como, não foram levados em consideração fatores como impacto financeiro de caixa e
reformulação de preço de venda, mas apenas o impacto tributário direto e custo de aquisição.
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1 Excluído IPI
2 Percentual estimado considerando somente entradas de mercadorias que geram crédito à 12% de ICMS.
3 Percentual estimado considerando somente entradas de mercadorias que geram crédito à 12% de ICMS.
4 A Secretaria da Fazenda ainda deverá publicar instrução normativa regulando a maneira como será estornado o ICMS sobre os estoques.
Marcello Noetzold Mafaldo
Professor Mestre em Finanças e Custos
Sócio do escritório NOMA Desenvolvimento e Gestão Empresarial
Cauê Cardoso Soares
Advogado Tributarista e consultor da ACI-NH/CB/EV
Sócio do escritório Buffon, Furlan e Bassani Advogados Associados