Tributação de lucros a partir de 2026: inaplicabilidade às empresas do Simples Nacional

Por ACI: 03/12/2025

A Lei nº 15.270/25, publicada no último dia 27 de novembro, trouxe importantes alterações na tributação sobre a renda, especialmente em relação ao Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), o qual será isento para as pessoas físicas que recebem rendimento de até R$ 5.000,00 mensais; terá alíquotas graduais para as que recebem rendimentos entre R$ 5.000,01 e R$ 7.350,00 e passará a incidir sobre os rendimentos das pessoas físicas que auferem altas rendas.

Por força da denominada tributação das altas rendas, a partir de janeiro de 2026, o pagamento, o creditamento, o emprego ou a entrega de lucros e dividendos por uma mesma pessoa jurídica, a uma mesma pessoa física residente no Brasil, em montante superior a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) mensais, ficará sujeito ao IRRF à alíquota de 10% (dez por cento) sobre o total do valor pago, creditado, empregado ou entregue à pessoa física.

O valor definitivo de Imposto de Renda (IR) dependerá da apuração junto à Declaração de Ajuste Anual do contribuinte, momento no qual será possível realizar as devidas deduções da base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física.  Entre as deduções citadas na lei, destaca-se a possibilidade de isenção dos lucros acumulados até 31 de dezembro de 2025, tendo como condição que a distribuição tenha sido aprovada até referida data (31 de dezembro de 2025) pelo órgão societário competente para tal deliberação, e desde que o pagamento, o crédito, o emprego ou a entrega ocorra nos anos-calendário de 2026, 2027 e 2028 e observe os termos previstos no ato de aprovação realizado até 31 de dezembro de 2025.

Nessa perspectiva, para preservar a parcela dos lucros acumulados até 31/12/25, há a necessidade de realização de assembleia geral ou de reunião de sócios para que seja deliberado sobre a distribuição dos lucros/dividendos, com a lavratura da respectiva ata, desde que se possa comprovar a observância do prazo mencionado.

Contudo, é possível sustentar, que as citadas exigências (necessidade de retenção mensal dos dividendos distribuídos, sua tributação na composição da Declaração de Ajuste Anual e a obrigação de deliberação acerca da destinação dos lucros acumulados até 31/12/25), sejam inaplicáveis às empresas optantes pelo Simples Nacional. Isso ocorre porque a matéria relativa ao Simples Nacional, por força constitucional, está reservada à Lei Complementar, não podendo ser instituída/alterada por Lei Ordinária, como é o caso da Lei nº 15.270/25.

A Constituição Federal (inciso III, alínea "d" do artigo 146 e artigo 179) exige que normas gerais em matéria de legislação tributária, em especial as que tratam de regimes diferenciados para micro e pequenas empresas, sejam estabelecidas por meio de Lei Complementar.

Art. 146. Cabe à lei complementar:

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

d) definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte, inclusive regimes especiais ou simplificados no caso dos impostos previstos nos arts. 155, II, e 156-A, das contribuições sociais previstas no art. 195, I e V, e § 12 e da contribuição a que se refere o art. 239. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 132, de 2023 - grifo adicionado).

Como se percebe, a Constituição é expressa no sentido de que qualquer alteração em matéria tributária envolvendo as regras aplicáveis a estes regimes especiais, como no caso, o Simples Nacional, demandaria a aprovação de uma Lei Complementar, com seu quórum próprio, o que não foi verificado na instituição da Lei nº 15.270/25.

Em vista disso, a novel legislação ordinária não poderia sobrepor-se ao que dispõe o artigo 14 da Lei Complementar nº 123/2006, no que refere expressamente à isenção do Imposto de Renda, na fonte e na declaração de ajuste do beneficiário, dos valores efetivamente pagos ou distribuídos ao titular ou sócio da microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional, salvo os que corresponderem a pró-labore, aluguéis ou serviços prestados. O artigo 14 da Lei Complementar nº 123/2006 é explicito no sentido de que são isentos do imposto de renda, na fonte e na declaração de ajuste os referidos valores:

Art. 14.  Consideram-se isentos do imposto de renda, na fonte e na declaração de ajuste do beneficiário, os valores efetivamente pagos ou distribuídos ao titular ou sócio da microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional, salvo os que corresponderem a pró-labore, aluguéis ou serviços prestados.

1º - A isenção de que trata o caput deste artigo fica limitada ao valor resultante da aplicação dos percentuais de que trata o art. 15 da Lei no 9.249, de 26 de dezembro de 1995, sobre a receita bruta mensal, no caso de antecipação de fonte, ou da receita bruta total anual, tratando-se de declaração de ajuste, subtraído do valor devido na forma do Simples Nacional no período.

 2º - O disposto no § 1º deste artigo não se aplica na hipótese de a pessoa jurídica manter escrituração contábil e evidenciar lucro superior àquele limite.

O reconhecimento deste tratamento especial foi corroborado na Solução de Consulta COSIT nº 244, de 26 de novembro de 2025, que trata da isenção da distribuição de lucros aos sócios, concluindo que o lucro total mensal distribuído a cada sócio não sofre retenção do IRRF mensal, caso a ME ou EPP optante pelo Simples Nacional possua escrituração contábil e demonstre, em um período menor que o anual, a existência de lucro superior ao limite para a isenção prevista no art. 14, § 1º, da LC nº 123, de 2006, apurado por meio da escrituração contábil, nos termos da legislação de regência.”

Diante desse cenário, embora nosso entendimento aponte para a inaplicabilidade das exigências da Lei nº 15.270/25 às optantes pelo Simples Nacional (em razão dos fortes argumentos constitucionais apresentados), a ausência de um posicionamento formal da Receita Federal impõe cautela. Por segurança, recomenda-se o cumprimento das obrigações previstas na Lei nº 15.270/25 por todas as empresas, inclusive as optantes pelo Simples Nacional, até que se obtenha uma posição definitiva do Fisco, momento em que será avaliada a necessidade de propositura de medida judicial.

Jordana Franzen Reinheimer e Marciano Buffon - Advogados
Buffon e Furlan Advogados Associados

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