Da GFIP ao eSocial: considerações sobre consolidação da obrigação tributária nos processos trabalhistas, dois anos após sua implementação, e desafios jurídicos para determinar momento adequado para envio das informações

Por ACI: 19/09/2025

A introdução dos eventos S-2500 e S-2501 no eSocial não criou a obrigação de reportar processos trabalhistas, mas transformou significativamente a dinâmica de cumprimento dessa exigência. Anteriormente, com a GFIP, essas informações eram previstas, embora raramente fiscalizadas de maneira sistemática.

Com o advento do eSocial, o que antes era visto como uma obrigação acessória marginal tornou-se central: passou a ser monitorada automaticamente pela Receita Federal, sem depender da iniciativa de juízes ou de fiscalizações esporádicas. Essa mudança reflete não apenas uma transformação tecnológica, mas também um redesenho da relação entre empresas, judiciário e Fisco.

É importante notar que a lógica do sistema obriga as empresas a integrar diversas áreas internas, como jurídico, contabilidade, recursos humanos e tecnologia, para possibilitar o envio correto dos dados. Na prática, não se trata mais de cumprir uma mera rotina burocrática. É necessário organizar fluxos de informação coerentes, que acompanhem a evolução processual e traduzam decisões judiciais em eventos eletrônicos e aqui surge o primeiro desafio: as próprias varas do trabalho, embora sigam as mesmas normas, frequentemente emitem decisões ou homologam acordos com interpretações divergentes, o que acentua a necessidade de padronização e a dificuldade de caracterizar o momento correto de envio das informações através dos eventos.

Essa complexidade é relevante porque não se trata apenas de escolher uma data para o envio. Um envio antecipado pode gerar inconsistências e até passivos tributários indevidos; um envio tardio, por outro lado, pode resultar em autuações e multas. A incerteza, portanto, não é meramente teórica: ela impacta diretamente o caixa das empresas e a previsibilidade de seus custos trabalhistas. Já se observam, inclusive, situações em que departamentos jurídicos e contábeis chegam a conclusões diferentes dentro da mesma organização, o que destaca a necessidade de maior maturidade no tema.

Do ponto de vista operacional, o evento S-2500 detalha o próprio processo trabalhista, incluindo partes, pedidos e valores reconhecidos, enquanto o S-2501 registra os reflexos previdenciários e tributários, como contribuição previdenciário do empregado e da empresa e o imposto de renda retido na fonte, quando houver.

Em teoria, o conceito parece simples, mas na prática é menos linear. Em processos com múltiplos recursos ou decisões parciais e até em acordos intermediários, identificar o marco que desencadeia a obrigação de envio pode ser menos óbvio do que o previsto nos manuais oficiais. O debate sobre o momento adequado para a transmissão dos arquivos ultrapassa a letra da lei envolve a interpretação de conceitos jurídicos como o trânsito em julgado, homologação parcial e até desistência tácita de pedidos.

Dois anos após a entrada em vigor dessa obrigação, é evidente que o eSocial trouxe vantagens em termos de transparência e padronização, mas também inaugurou uma fase de desafios interpretativos. A uniformização ainda depende de ajustes, tanto normativos quanto práticos e da consolidação de entendimentos entre Fisco, Judiciário e empresas. Nesse contexto, a postura mais prudente é investir em procedimentos internos como a criação de procedimentos de análise, treinamento de equipes e acompanhar de perto a jurisprudência e as atualizações tanto do sistema quanto do poder judiciário. Mais do que um requisito técnico, o correto envio dos eventos trabalhistas tornou-se um indicador de conformidade, maturidade de gestão e segurança jurídica para as organizações.

Solange Neves - Advogada
Integrante do Comitê Jurídico da ACI-NH/CB/EV/DI
Solange Neves Advogados Associados

Hefferson Leon - Contador
Henares Advogados

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