ESG e contratos comerciais: a nova fronteira do setor de papel e celulose

Por ACI: 02/12/2025
Ana Carolina Lopes Sequeira dos Santos, diretora legal LatAm da Valmet

Quem atua no universo dos contratos comerciais sabe que esses instrumentos funcionam quase como um termômetro das transformações do mercado e da sociedade. Nos últimos anos, acompanhamos uma sucessão de movimentos que impactaram diretamente as relações contratuais entre empresas.

Primeiro, veio o período de adaptação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que, em seu início, gerou inúmeras dúvidas práticas sobre a aplicação da norma e trouxe desafios à formatação dos contratos. Em seguida, durante a pandemia da covid-19, assistimos à ascensão das cláusulas de força maior, até então muitas vezes deixadas em segundo plano, mas que repentinamente se tornaram protagonistas nos debates jurídicos e negociais.

Agora, a atenção se volta para uma nova pauta que vem redesenhando o cenário contratual: o ESG — Environmental, Social and Governance ou, em português, Ambiental, Social e Governança. Inicialmente restrito a nichos empresariais específicos, o conceito rapidamente ganhou força e se consolidou como diretriz essencial das práticas corporativas. No setor de papel e celulose, essa influência se faz sentir de maneira particularmente intensa, em razão da relação direta da atividade industrial com temas ambientais, gestão responsável de recursos naturais e impactos sociais nas comunidades locais.

Hoje, é praticamente impensável negociar contratos de fornecimento de tecnologia, insumos ou serviços para essa indústria sem considerar as políticas e práticas ESG envolvidas. Onde antes o avanço tecnológico e as estratégias comerciais ocupavam o centro das discussões, o protagonismo agora é compartilhado com a busca por equilíbrio entre inovação, sustentabilidade e responsabilidade social. O que antes era uma tendência de mercado passou a ser uma exigência de governança.

Dentro dos contratos, as obrigações relacionadas ao ESG se manifestam de forma pulverizada, muitas vezes sem a percepção imediata de que fazem parte desse mesmo conceito. No entanto, quando analisadas sob uma perspectiva mais ampla, revelam clara correlação com os pilares ambiental, social e de governança. Entre essas obrigações, destacam-se: a preferência pela contratação de mão de obra local, acompanhada do dever de qualificação dessas pessoas; o controle e a redução de ruídos e outras formas de poluição sonora; a responsabilidade por danos ambientais e pelo cumprimento da legislação vigente; a vedação ao trabalho infantil e ao trabalho análogo à escravidão, tanto por parte da contratada quanto de seus subcontratados; e a verificação da idoneidade de todos os integrantes da cadeia produtiva, garantindo que os serviços sejam prestados de forma sustentável e em conformidade com a lei.

Exemplos das empresas

Essas previsões contratuais, antes vistas como meras formalidades, vêm ganhando relevância real na gestão dos negócios. E não apenas na teoria: observa-se um esforço concreto das principais empresas do setor para adequar suas operações aos compromissos de ESG. A Suzano, por exemplo, declarou ter atingido, em 2023, 88% de energia proveniente de fontes renováveis. A Bracell, em 2024, anunciou ter alcançado 72% de energia limpa em seu processo produtivo. Já a Klabin figura, por cinco anos consecutivos, entre o “top 1%” em práticas ESG, segundo a S&P Global.

Entre os fornecedores, empresas como a Valmet vêm demonstrando comprometimento semelhante, com auditorias e fiscalizações constantes em suas cadeias de suprimentos para assegurar a aderência às políticas de sustentabilidade e eliminar práticas contrárias aos princípios ESG. Tais iniciativas indicam que o tema não se restringe a cláusulas contratuais e se traduz em ações efetivas e mensuráveis, impactando positivamente toda a estrutura produtiva do setor.

Ainda assim, há um longo caminho a ser percorrido. O compromisso assumido pelas empresas, muitas vezes formalizado inicialmente nos contratos comerciais, precisa se traduzir em condutas concretas, capazes de transformar essa tendência em prática permanente. O verdadeiro desafio está em fazer com que o ESG deixe de ser apenas uma exigência formal ou um diferencial competitivo e passe a integrar, de forma autêntica, a cultura empresarial e a estratégia de negócios. No setor de papel e celulose, esse avanço já é visível, mas sua consolidação dependerá da capacidade de manter o equilíbrio entre eficiência econômica, responsabilidade social e sustentabilidade ambiental — elementos que, mais do que cláusulas contratuais, representam hoje os pilares de uma nova maneira de fazer negócios.

Ana Carolina Lopes Sequeira dos Santos, diretora legal LatAm da Valmet

 

Receba
Novidades